Lembro até hoje de
várias histórias da minha infância, mas essa eu guardei com um carinho especial.
Acho que tinha 3 ou 4 anos quando ganhei do meu pai um canário amarelo dentro de uma gaiola. Minha mãe dizia que eu o
amava tanto que vivia ao seu lado cantando. Aprendi a cuidar dele e a lhe dar
carinho, mas percebi que só meu amor não era o suficiente. Pois algumas vezes ele
ficava triste e não cantava. Eu sentia sua tristeza mas não sabia de onde
vinha.
Então meu pai me disse
que ele era um pássaro e que amava voar, amava a liberdade, e eu
precisava abrir a gaiola e deixá-lo ir. Mas se ele também me amasse voltaria,
porque saberia que ali era seu lugar, sua casa.
Então, mesmo não
querendo eu permiti que meu pai abrisse aquela gaiola.
Ao vê-la aberta ele saiu timidamente e voou.
Ao vê-la aberta ele saiu timidamente e voou.
Um dia inteiro se
passou, e eu esperei ali. Igual a gaiola vazia estava meu coração também vazio.
No dia seguinte ele também não veio, então passou uma semana e depois de tanta espera ele finalmente apareceu, cansado e sem rabo.
Eu
ainda era criança para entender a raridade com que essas coisas acontecem.
Mas lembro
do sentimento de alegria que confortava meu, ainda pequeno, coração.
E então por muito tempo
foi assim, sua gaiola sempre aberta, e ele tinha a liberdade de ir e voltar.
Saía todos os dias para passear, mas durante a noite voltava para casa.
Meus pais diziam que os vizinhos ficavam impressionados com a inteligência do meu melhor amigo. Mas na
minha ingenuidade eu achava que aquilo era normal, que deveria ser assim o
amor, livre.
E assim foi a minha vida inteira, eu aprendi a deixar a gaiola
aberta. Eu também entendi que ninguém possui ninguém a ponto de tirar a
liberdade dessa pessoa.
Um dia, aconteceu o que
eu mais temia, ele não voltou.
Os dias se passaram e ele nunca mais voltou.
Meu
pai me explicou que não era porque deixou de me amar, é que alguma coisa devia
ter acontecido a ele, mas que devia estar bem em algum lugar. E então me disse
que era importante lembrar somente das coisas boas, e que na vida seria assim,
e eu precisava sempre seguir em frente que muita coisa boa ainda estava por
vir.
E assim fui descobrindo
que amar é muito difícil, mas também é muito fácil. Nem sempre somos correspondidos, mas se for recíproco não podemos deixar esse sentimento de posse roubar a liberdade de ninguém e nem matar o amor.
Em algumas noites ainda
escuto um canário cantando no meu ouvido.
Ainda sinto meu velho amigo aqui ao
meu lado, pertinho do meu coração que hoje é uma gaiola vazia.
E em outras noites acho
que também sou um pássaro perdido, que ama voar e sentir-se livre, mas que
também procura a porta aberta de um coração para se abrigar.